sexta-feira, 5 de julho de 2013

Olhando este país

(actualizado)

Perante a situação política presente, face à repentina demissão de Paulo Portas, não resisto a voltar a escrever neste espaço.
Depois de ver, ouvir, ler e pensar sobre o assunto, tinha de dizer qualquer coisa.

Vamos por pontos:

1 – a demissão de Vítor Gaspar era praticamente inevitável. Tendo em conta o nível de contestação, e os desentendimentos no seio do Governo, a persona tinha de ser alterada. Com isto não quero dizer que o rumo deva ser substancialmente alterado. Infelizmente não é possível mudar muito, ou até a definição desse rumo depender da vontade de Portugal. No entanto, é necessária uma forte vertente política que explique esse rumo, que mostre um destino, que faça os cidadãos terem esperança. Essa componente política tem sido uma grande lacuna deste governo.

2 – a demissão de Paulo Portas: uma irresponsabilidade e estupidez pegada. Sendo o Governo de coligação entre dois partidos, têm de se entender. O interesse nacional é superior ao interesse político de cada partido ou de cada líder. O que se passou é inaceitável.

Aceito que haja diferenças de posição num governo que junta vários partidos, mas têm de sentar-se à mesa e chegar a um consenso, longe dos holofotes mediáticos.

O que levou efectivamente o Ministro dos Negócios Estrangeiros a demitir-se? Quanto a mim foram vários os factores: os desentendimentos com o Primeiro-ministro, e não conseguir impor o seu entendimento do rumo a seguir durante o consulado de Vítor Gaspar; não concordar com a escolha de Maria Luís Albuquerque para nova Ministra das Finanças; nestes dias houve notícias de que a troika queria mais cortes (nas pensões, no salário mínimo, na função pública…), e ele não concordou; tinha de apresentar o relatório para o corte de 4 mil milhões, e não tinha coragem para tal; ficando como nº 2 do Governo, seria amarrado ao seu destino e resultado, e não quis esse ónus.

3 – há vários anos que digo que em Portugal há três animais políticos: Mário Soares, Alberto João Jardim e Paulo Portas. Goste-se ou não deles, é uma qualidade que temos de lhes reconhecer. Mas a pequena política e o contorcionismo têm como limite o interesse nacional.

4 – a brincadeira de Portas custou muito ao país em termos de credibilidade e de financiamento. E pode vir a implicar mais dificuldades para os portugueses. Não é aceitável, num momento de dificuldade como o que atravessámos, deitar a perder dois anos de sacrifícios.

5 – neste contexto, embora descontando o “seria precipitado aceitar esse pedido de demissão” (que Passos Coelho disse acerca da demissão de Portas, e que não me parece que possa fazer), o Primeiro-ministro, quanto a mim, foi o único que teve bom senso na sua declaração. 

6 – após isto, o CDS, que foi surpreendido pela demissão de Portas, mandatou o mesmo Paulo Portas que não se entendeu com Passos Coelho para renegociar com ele. Não percebo esta lógica e não faz sentido para mim.

Este fim-de-semana teria lugar o congresso do CDS, que já foi desconvocado. Não percebo como Paulo Portas poderá manter-se na liderança do partido. 

Não é possível o partido ter um discurso de responsabilidade, e depois essa imagem ser deitada por terra por atitudes assim.

7 – naquilo que tem vindo a público sobre as reuniões entre Passos Coelho e Portas há coisas que (embora não confirmadas) não percebo: 

     a) Portas voltar ao governo? Não pode ser. Nem por pressão de Cavaco, como li há pouco, nem por outra via. Não faria qualquer sentido.

       b) Passos Coelho não pode ceder e demitir a recém-empossada ministra das Finanças. Seria o descrédito absoluto.

       c) Se a solução de coligação existente até antes da demissão de Portas se revelou tão frágil, como seria sólido um acordo diferente e sem o eventual líder do segundo partido fora do governo? 

8 – quanto à oposição à esquerda... desde sempre que pede a queda do governo e eleições antecipadas (o PS também se converteu a este coro há uns meses). Com a crise governamental desta semana, foi possível ver as consequências da instabilidade política: bolsas a caírem, juros a disparar, credibilidade do país posta em causa, potencialmente maior dificuldade no acesso aos mercados, logo mais empresas em dificuldade e mais desemprego, imposição de mais austeridade. 

Quando o governo, por incompetência, quase realiza o seu pedido, vêm logo gritar que o governo é irresponsável. Então o que foram eles durante estes dois anos? Eles queriam agravar a crise e as dificuldades nacionais.

9 – como disse no dia em que Portas apresentou a demissão: além de uma esquerda incompetente, agora temos uma direita estúpida. Num momento dificílimo e dramático da nossa vivência colectiva, não consegue entender-se para reformar o país e o Estado. Ficamos todos a perder.

10 - a crise e a austeridade não começaram há dois anos; começaram quando o país andou a gastar o que não tinha. A causa da nossa crise/desgraça não se chama Passos Coelho, Gaspar ou Portas - chama-se país falido.

1 comentário:

Jingas disse...

Teu ponto 9 resume tudo.

Beijinhos. Já tinha saudades de te ler :)

Vens cá no verão? Há arraial nos próximos dois fds ;)